sexta-feira, 9 de março de 2012

:: Oscar, Chico e Tom ::




“A casa do Oscar era o sonho da família. Havia um terreno para os lados da Iguatemi, havia o anteprojeto, presente do próprio, havia a promessa de que um belo dia iríamos morar na casa do Oscar. Cresci cheio de impaciência porque meu pai, embora fosse dono do Museu do Ipiranga, nunca juntava dinheiro para construir a casa do Oscar. Mais tarde, num aperto, em vez de vender o museu com os cacarecos dentro, papai vendeu o terreno da Iguatemi. Desse modo a casa do Oscar, antes de existir, foi demolida. Ou ficou intacta, suspensa no ar, como a casa no beco de Manuel Bandeira.
Senti-me traído, tornei-me um rebelde, insultei meu pai, ergui o braço contra minha mãe e saí batendo a porta da nossa casa velha e normanda: só volto para casa quando for a casa do Oscar! Pois bem, internaram-me num ginásio em Cataguases, projeto do Oscar. Vivi seis meses naquele casarão do Oscar, achei pouco, decidi-me a ser Oscar eu mesmo. Regressei a São Paulo, estudei geometria descritiva, passei no vestibular e fui o pior aluno da classe. Mas ao professor de topografia, que me reprovou no exame oral, respondi calado: lá em casa tenho um canudo com a casa do Oscar.
Depois larguei a arquitetura e virei aprendiz de Tom Jobim. Quando minha música sai boa, penso que parece música do Tom Jobim. Música do Tom, na minha cabeça, é casa do Oscar.”
Chico Buarque de Holanda

domingo, 1 de janeiro de 2012

:: Tantas outras ::




Carrego dentro de mim, muitas outras de mim.
Sou tantas coisas e já fui tantas outras.
Tem gente que me conhece partes, outros não gostam de tudo, alguns nem imaginam.
Me reagrupo de tempos em tempos. Me organizo quase nunca, é meio bagunçado mesmo.
Mas carrego tudo comigo. E tento ser leve.
Não como reservatório,  mas como rio que flui.
Sempre há espaço para novas outras, sem limites, sem rótulos, sem sentido.
É Meio bagunçado mesmo. Nesse oceano algumas partes se perdem.
Mas o bom de ser muitas é que há sempre quem sai pra procurar, enquanto as outras continuam seguindo em frente. É divertido.
Tem dias que parece reunião de condominio descidindo um novo síndico.
Algumas não se dão. Outras implicam com a vizinha nova. É chato.
E nessa gangorra aprendo a me equilibrar.
Afinal são elas que habitam a minha alma.